segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

A ROSA DO LIVRO



Quando abriu o livro, um aroma adocicado com pitadas de poeira dançou no ar...
Lílian esboçou um sorriso, fechou os olhos tentando remeter os pensamentos até o nascimento daquela rosa amarela, que gentilmente acomodou-se dentro do livro por anos.
Lílian, com o livro aberto, sentou-se na poltrona que ficava perto da janela, onde mostrava um roseiral com brotos amarelos, despontando.
Era final de tarde e o céu em tons de vermelho alaranjado começava a retirar as sombras dando lugar ao anoitecer calmamente.
Lílian, sentada e com o livro apoiado sobre suas coxas, pegou a rosa seca e tentou tirar um pouco mais de perfume, porém parecia que o pouco que restava sumiu no ar ao abrir o livro.
Mais uma vez ela fechou os olhos e tentou encontrar os olhos dele...
Rapidamente fez as contas e já havia se passado mais de dez anos. Ainda conseguia sentir o tanto que aquele olhar penetrava em sua alma. Era como se lesse sua mente alcançando seus mais profundos desejos. Ela lembrou que ficava corada quando ele provocava isso nela.
Depois do olhar, um sorriso malicioso... E a aproximação para um beijo, somente um toque nos lábios, só pra provocar mesmo. Era o suficiente para Lílian sentir as pernas bambas e o estômago borbulhar. 
Nunca mais teve notícias dele.
Num impulso, pegou o celular e foi pesquisar na internet, em redes sociais, todos os lugares possíveis. Não encontrou nada. A morte lhe veio à cabeça. Será? Pensou ela.
Respirou fundo, disse a si mesma que era besteira pensar no mal, que ele poderia muito bem ter vida fora da internet, ou então usar um apelido, ou ter conta conjunta com alguém...
Mais uma vez mudou o pensamento, não queria quebrar o encanto daquele olhar que tanto a desestabilizava. 
Era o amor da vida dela, que não foi vivido, mas foi procurado em muitos outros olhares. Alguma coisa nos outros teria ele, e ela encontrava... 
Por vários momentos eles se topavam em algum lugar, e uma dessas topadas, ele a presenteou com essa rosa. Ou era em supermercado, em shopping, em alguma loja, na rua, e depois ficavam um bom tempo sem terem notícias um do outro. Até não ter mais notícia nenhuma.
Talvez fosse bom por isso, por não haver convivência por muito tempo. Não criou o hábito de reparar e criticar os defeitos. Talvez esse seria o encanto de amores da vida.
Lílian colocou a rosa dentro do livro, fechou e guardou ele na estante. Se é amor eterno, que seja guardado eternamente.
Lílian parou frente a janela e observou as roseiras, fechou os olhos e encontrou os olhos dele, penetrando em seu corpo, tirando seu fôlego, sua paz, a boca seca... Saudades.

Clara Lúcia



 

9 comentários:

  1. Não criou o hábito de reparar e criticar os defeitos. Talvez esse seria o encanto de amores da vida.

    Boa tarde de paz, querida amiga Clara!
    Creio muito no poder de ruminar as virtudes do outro.
    Quem fica vendo só defeitos perde muito da vida com qualidade.
    Um conto muito bem escrito com uma mensagem magnânima.
    Tenha dias de descanso abençoados!
    Beijinhos carinhosos e fraternos

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    1. Defeitos são só aos nossos olhos e implicância. A maturidade nos faz ser mais leves, não é?
      Beijos, querida!

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  2. Que lindo conto! E ficará sempre dentro do livro guardada a rosa e o sentido dela, no coração! Adorei! beijos, chica

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  3. Clara Lúcia como pode uma pessoa que mal me conhece estar a contar a minha história? Beijos menina e obrigada.
    Júlia

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    1. Que delícia! Contar histórias reais é uma maravilha!!!
      Beijos, querida!

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  4. Maravilha.
    "Não criou o hábito de reparar e criticar os defeitos. "
    Penso que seja esse o segredo!.
    Brisas doces *

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