segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Um Amor Pra Cuidar


Já passava das dezoito horas e José Pedro ainda não havia chegado em casa. Odete já havia arrumado toda a bagagem para irem ao sítio. Ela já estava aflita, ligou no celular do marido e nada dele atender. Praguejou como de costume, tentou mais uma vez e desistiu. Conversando sozinha, deduziu que ele, talvez, estivesse dirigindo. Ainda falando sozinha, conferiu a bagagem para ver se não estava se esquecendo de nada. Sim, sentiu falta da garrafa de café e da manteiga. Praguejando para ela mesma, colocou o que faltava junto com as outras coisas.
José Pedro chegou buzinando, rindo, na certeza de que essa atitude irritaria Odete. Imediatamente ela colocou a cabeça para fora da janela e gritou com ele, dizendo que ela não era surda e que tinha nome, e que era para ele descer e entrar para trocar de roupa. Ele gargalhou e obedeceu a mulher.
Quando ele entrou, Odete estava com a testa franzida e os lábios protuberantes, desenhando um beiço que quase se arrastava pelo chão, como assim descrevia José Pedro.
Mal ela começou a reclamar, ele chegou a ela e deu-lhe um beijo na testa e um tapinha na bunda, como de costume. Ela se afastou e tacou-lhe um tapa no ombro, como sempre fazia. Ele riu e se dirigiu ao seu quarto para trocar de roupa e, por fim, seguirem para o sítio que ainda estava em construção. Enquanto ele se afastava, Odete riu, com aqueles olhos de orgulho em ver o marido empenhado na construção do sítio, seu grande sonho. Ajeitou os cabelos e pegou a bagagem para levar ao carro.
No caminho, quem mais falava era Odete, orientando o marido a fazer tal coisa antes de qualquer outra coisa. No intervalo entre uma frase e outra, ele contava como tinha sido seu dia. E depois concordava com a mulher em fazer o que ela sugeriu. Já estava programado ele fazer primeiro o que ela havia sugerido, mas ele sabia que ela o lembraria mesmo assim. E Odete, toda senhora de si, se sentia essencial na organização de qualquer coisa em que o marido iria fazer.
Chegando lá, a primeira coisa que José Pedro sempre fazia era ir até a cisterna e ver o nível da água. Como era tempo de chuvas, estava uma beleza o espelho no topo dela, refletindo seus cabelos brancos e bochechas rosadas. Odete observava de longe, enquanto preparava o café e colocava a mesa com xícaras, talheres e pães. Resmungou bravamente por ter esquecido, sobre a mesa de sua casa, o pacote com pão de queijo fresquinho. Ela se deu um tapa na testa como forma de punição pela falha imperdoável. "Ah, mas estava tão quentinho, fresquinho, como fui esquecer?", lamentava meneando a cabeça.
O aroma de café rapidamente se espalhou pela casa, chamando por José Pedro, que prontamente entrou pela cozinha, sorrindo. Para Odete, a hora em que a comida chamava o marido era a hora da glória. Pura felicidade em alimentar aquele companheiro de longos anos, que a entendia como ninguém, e, principalmente, a obedecia nos seus mandos.
José Pedro sentou-se, colocou o café na xícara, rasgou um pedaço do pão e, sem utilizar a faca, passou-o na manteiga. Odete, como sempre fazia, reclamou dele, dizendo que a faca estava do lado do pote e que não precisava estragar a manteiga assim. Ele, sábio como sempre, para mudar de assunto e acabar com a braveza da mulher, começou a contar sobre o galinheiro, que queria aumentá-lo e comprar mais galinhas para começar a vender os ovos pela vizinhança. Claro que Odete adorou a ideia e já pensou longe, em comprar um carro apropriado, contratar alguém pra ficar lá direto e cuidar de tudo, em comprar um telefone próprio, enfim, ela adotou a ideia e José Pedro já sabia que ela se empenharia em ajudá-lo.
Depois de terminado o café, enquanto Odete lavava a louça e já pensava no que fazer para o jantar, José Pedro percorreu toda a cerca de arame farpado, só para se certificar se não havia nenhum dano. Bem no fundo da casa, ele encontrou um ninho com ovos de galinha. Olhou para os lados e não viu nenhuma perdida pelo vasto terreno. De quem seria, se as suas crias estavam todas cercadas no próprio galinheiro? Chamou a vizinha de cerca e perguntou a ela se alguma galinha havia escapado do galinheiro. Ela, surpresa, disse que sim, tinha uma franguinha que sempre escapulia, depois voltava como se nada tivesse acontecido. Eles riram, ela pegou os ovos e agradeceu a ele. Ofereceu dividir os ovos com ele, ele agradeceu e disse que não tinha necessidade.
Continuou sua caminhada ao lado da cerca e constatou que tudo estava em perfeita ordem. Em frente a casa, parou, colocou as mãos na cintura e imaginou a piscina, sua próxima obra. Já havia até medido o tamanho, e pensava em colocar a famosa cascata. Seus filhos amariam, deduziu. Imaginou plantar árvores em volta, para assim terem mais privacidade, pois quem passava no portão, enxergava a casa. Isso seria uma medida para afastar os curiosos.
Odete, de dentro da cozinha, gritou pelo marido, que respondeu prontamente. Disse que faria carne de panela com batatas, arroz, feijão e salada de tomates. Perguntou a ele se estava bom. Ele disse que sim. Quando ela fazia essa pergunta, geralmente ele emendava alguma sugestão, o que não o fez nesse dia. Odete estranhou e foi até a porta ver o que estaria acontecendo.
Viu-o olhando para a paisagem, parado com as mãos na cintura parecendo perdido.
- Bem, ô bem, que foi que cê tá aí pensando? - perguntou.
- Nada, não, tô só pensando aqui...
Não satisfeita, ela largou o pano de prato sobre a mesa e foi até o marido. No meio do caminho já começou a falar sobre a piscina, que queria naquele mesmo lugar em que ele já havia determinado, que gostaria, se ele concordasse, claro, de colocar cascata. Ela já havia pesquisado o preço e dava para colocar sim. E sugeriu, depois de tudo pronto, plantar árvores em volta dela, para que eles tivessem mais privacidade.
Ele olhou para ela:
- Mas óia, gostei da ideia, viu? Vou fazer assim mesmo. O que você acha de fazer ela mais perto da varanda, pra gente colocar uma portãozinho e nem precisar sair dela pra entrar na piscina?
Odete ficou pensando...
- É, acho que vai ficar melhor assim mesmo.
José Pedro abraçou sua mulher e beijou-se o topo da cabeça, já que ela era bem mais baixa que ele.
Ela retribuiu, abraçando sua cintura.
E "entraram pra dentro", como era costume falarem no interior.

José Pedro e Odete, casados há mais de vinte anos, companheiros, felizes, com muito amor.

Clara Lúcia

2 comentários:

  1. Tão lindo esse amor assim, a cumplicidade, amizade que une quem há tantos anos partilha a vida! Adorei! bjs praianos,chica

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  2. Boa tarde Clara!
    Tanto tempo não passava aqui. Eu dei uma pausa e demorei um pouco mais. Gostei muito da história, lindamente construída. Difícil encontrar relacionamento duradouro nos dia de hoje. O que falta é o amor leal e verdadeiro.
    Beijos e boa semana Clara!

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