sábado, 4 de setembro de 2021

DIAMANTE E VINHO

Foto de lehandross no Pexels

 Final de tarde, verão, pessoas apressadas em busca de uma brecha nas calçadas para não perderem o compasso dos pés na ânsia de chegarem mais rápido ao seus destinos, Fernanda, com lentidão, precisava se esquivar de possíveis esbarrões a sua frente. Em sua doçura costumeira, caminhou no canto esquerdo para poder ter sossego e apreciar o contraste das luzes dos postes com o avermelhado do Sol. Coisa mais linda de se ver!

Em plena segunda feira o movimento não parava. Fernanda, por um momento, pensou nos dias em que passou por ali e não prestou atenção na maravilha de cores do céu azul se transformando em um tom quente, como se o Sol insistisse em deixar sua quentura no ar, lamentando ter que se por. 

Fernanda não tinha pressa. Nem os saltos altos de seus scarpins dificultavam a desenvoltura de sua caminhada. E pouco se importava em ser um empecilho no caminho dos outros, que às vezes olhavam para ela com certo ranço por atrapalhar a pressa em vencerem a corrida ao destino deles.

As estrelas já apontavam do outro lado do céu quando Fernanda chegou em sua casa. Pensou na sorte que teve em morar perto de seu trabalho, que aliás era outra sorte grande, onde fazia seus horários e seus dias. A facilidade da internet proporcionava certas comodidades. Comparecer na sede da empresa algumas horas por semana era a melhor facilidade de vida que ela sequer poderia imaginar tempos atrás.

Ao fechar o portão de sua casa, já ouvia o miado de seu gato preto Diamante. Ao entrar pela porta, ele se enroscou nas pernas de Fernanda e saiu correndo para o quarto dela. E logo voltou com um brinde para sua dona, um pedaço de lagartixa. Com cara de nojo Fernanda não ousou tocar em Diamante, e ele, desistindo, deixou o pedaço do bicho cair no chão. Fernanda pegou ele no colo e foi sentar-se no sofá para brincar um pouco com seu companheiro peludo. Tirou os sapatos, deitou, suspirou e sorriu. Diamante aproveitou e deitou sobre Fernanda, acomodando a cabeça próxima ao queixo dela. Ela alisava-o ternamente, falando coisas que só quem tem animaizinhos de estimação fala. Por fim cochilou.

Depois de um tempo Fernanda acordou e observou o céu azul escuro respingado de prata em forma de estrelas, através de sua imensa janela de vidro.

Procurou por Diamante e encontrou-o estirado no chão, como se procurasse o geladinho do piso frio da sala para refrescar a barriga.

Fernanda levantou, pegou uma taça e encheu-a de vinho tinto suave, bem geladinho, que era seu preferido. Voltou para a grande janela de vidro, sentou-se na poltrona que ficava em frente, apoiou os pés no parapeito e ali permaneceu saboreando o vinho preferido e esperando Diamante saltar sobre seu colo para contemplar a noite.

Um começo de semana tranquilo, para quebrar o paradigma cultural de tantas pessoas, em menosprezar a segunda feira.

Às vezes Fernanda se sentia só e desejava ter alguém para compartilhar aquela taça de vinho, e sabia que para isso teria que abrir o coração e vibrar a vontade de ter companhia, porém estar em casa e contemplar Diamante e vinho sob um céu estrelado fabuloso, essa vontade poderia esperar mais um pouco.

Mais um pouco... Quando o inverno chegar, quem sabe?


Clara Lúcia

4 comentários:

  1. Às vezes ficar só é o melhor programa. Fernanda sabe esperar o momento, a pessoa.
    Beijo, maninha.

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  2. Uma boa noite Clara, vamos ver o que sua personagem decide, uma vez que estar só, muitas vezes é estar bem acompanhado. Um vinho e um luar bonito, faz inspirar. Mas o coração de Fernanda vive aos pulos e penso que busca um acompanhante menos fiel que Diamante.
    Beijo amiga e feliz domingo.

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  3. Ninguém pode ter o melhor dos dois mundos. Nem a Fernanda, rs.
    Muito bom, Clara. Gostei de ler.
    Bjs
    Marli
    Blog da Marli

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  4. Em sua doçura costumeira, caminhou no canto esquerdo para poder ter sossego e apreciar o contraste das luzes dos postes com o avermelhado do Sol. Coisa mais linda de se ver!

    Boa tarde de Domingo, querida amiga Clara!
    Antes só do que mal acompanhada.
    Gostei muito do jeito de ser de Fernanda. Temos muito em comum, até no sabor do vinho.
    Creio que ela irá optar por viver com quem não a engane jamais.
    Tenha novos dias abençoados!
    Beijinhos com carinho de gratidão

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