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sábado, 16 de dezembro de 2017
Em Qual Segundo O Amor Se Perdeu?
— Alô, por favor, tem algum quarto pequeno e simples vago aí? Sim, pode ser, em meia hora eu chego e acerto tudo. Obrigado! — Arnaldo, após fechar a mala, lavou o rosto e ficou se olhando no espelho.
Enquanto detalhava sua fisionomia refletida, procurou uma explicação para que tudo tenha terminado tão rápido. Ontem mesmo havia se casado, tudo lindo e perfeito!
Anitta, linda toda de branco e com um sorriso terno e cativante, que foi um dos motivos que ele tinha se encantado. Meiga, calma e charmosa, chegava a irritá-lo quando precisava de uma urgência ou de uma rapidez que pra ela seria incapaz de executar. Os opostos se atraem e com eles não foi diferente.
Arnaldo apoiou as mãos na pia, abaixou a cabeça e chorou. Foi a primeira vez que lamentou não ter dado certo a união que prometia ser eterna. O amor também acaba...
Anitta ficaria no apartamento, ele seguiria seu rumo sem certeza nenhuma. Apenas partiria.
Olhou novamente seu reflexo e, voltando os pensamentos ao passado, tentou se lembrar em qual instante o amor havia se perdido. Não conseguia se lembrar. Talvez o desgaste, a falta de diálogo ou de tempo para os dois. Lembrou-se da época de namoro quando os dois tinham tempo um para o outro. Finais de semana, feriados, ou mesmo à noite, durante a semana, sempre davam um jeito de estarem juntos.
A rotina acabou com o casamento exatamente um ano depois.
Não tinham mais vida social, os amigos se afastaram, ou melhor, eles se afastaram dos amigos, o encanto havia se transformado em presença invisível, tudo muito automático e tedioso.
Não se lembrava de ter conversado com Anitta sobre o assunto. Ela também não gostava de discutir relação e nem implicar com nada. Apenas vivia sua vida tranquila e talvez a responsabilidade de dirigir uma casa tenha sobrecarregado sua rotina. Estava sempre cansada, mesmo não reclamando, era clara a insatisfação em ter que fazer coisas corriqueiras. Arnaldo ajudava, mas reconhecia que deixava a desejar na ajuda doméstica. Talvez ele esperasse por um puxão de orelhas, ou então uma ordem para fazer isso ou aquilo, mas partindo de Anitta, a tranquilidade em pessoa, seria impossível. Não percebeu que os dias passaram e que Anitta foi perdendo o interesse pela vida de casada.
Lembrou dos conselhos de sua avó, de que quem governa o lar é sempre a mulher. Ela quem determina como será a vida a dois, o momento de cada coisa e, para ele ficar atento, pois se ela se desinteressasse, dificilmente voltaria atrás. Uma luz brilhou refletida no espelho e Arnaldo chegou à conclusão de que nem todas as mulheres são como sua avó mencionou. Talvez Anitta fosse diferente, e ele ficou esperando ela governar uma casa que nem ela mesma queria governar. Talvez ela esperasse uma atitude voluntária de sua parte em participar dos afazeres.
Por fim, pela falta de interesse dela, ele saía com amigos e até se interessava por outras mulheres, mas a presença da mulher era grande demais para se aventurar em outras camas. Para ele era normal ser assim, mas hoje, depois de fechar a mala, percebeu que foi ele quem se afastou do casamento. Ela sempre esteve ali ao seu lado, e ele preferiu se calar e esperar por uma atitude dela.
Um arrepio percorreu sua coluna só em pensar em Anitta nos braços de outro homem... Será?
O que diria sua avó? Seus conselhos seriam bem-vindos nessa hora, mas preferiu resolver tudo sozinho.
Arnaldo colocou os sapatos, pegou a mala e o casaco que estava sobre a cama, respirou fundo e seguiu para a sala.
Anitta estava sentada no sofá, pernas cruzadas, braços abertos e apoiados no encosto do sofá, e olhou profundamente o marido. Também respirou fundo e chorou. Arnaldo, vendo aquela cena não se conteve e se ajoelhou aos seus pés, como se implorasse uma segunda chance a ela, em nome do amor. Não disse nada, apenas ficou esperando uma palavra dela. E a história de esperar uma atitude de Anitta se repetiu. Com dificuldade disse a ela que a amava, que não queria sair dali com mágoa e se houvesse uma única chance de recomeçar, ele aceitaria as condições que ela quisesse.
Anitta levou as mãos ao rosto e chorou. Depois limpou as lágrimas, colocou suas mãos sobre as mãos dele e disse que também o amava, mas estava cansada e queria ficar sozinha um pouco. Não havia se adaptado ao casamento e estava incomodada com o descaso dele todos os dias. Na verdade ela não percebeu que esse era o jeito dele.
Arnaldo, num impulso, levantou-se, segurou as mãos de Anitta, e fez com que ela também se levantasse. Imediatamente ela o abraçou, forte...
Se beijaram e logo se entregaram um ao outro. O sexo era o ponto forte daquela relação. Arnaldo não soube precisar quando o sexo deixou de fazer parte da rotina. Para ele era sempre o cansaço dela, e para ela era o descaso dele durante o dia que a deixava sem vontade nenhuma de ter relação com ele. Como sempre um não soube decifrar o que o outro queria. Queriam que desse certo, mas nenhum dos dois tomou a iniciativa para evitar o fim do casamento.
Se declararam, apaixonados... A noite toda se amaram...
Arnaldo, tranquilo em sua cama, levantou-se de manhã, abraçou Anitta acordando-a. Ela, porém, se afastou dele e disse que o que havia acontecido foi apenas uma despedida. Ela não havia mudado de ideia da separação.
Arnaldo foi ao chão! Não conseguia entender o raciocínio dela em consentir uma noite maravilhosa e depois afirmar que estava tudo acabado.
Ele sentou-se na cama sobre os calcanhares e riu...
Isso deixou Anitta muito irritada. Ela levantou-se, se enrolou no lençol e foi ao banheiro. Antes de fechar a porta disse a ele que não sairia de lá até que ele pegasse suas coisas e fosse embora.
Arnaldo, colocou as mãos na cabeça, respirou fundo, vestiu-se, pegou a mala e saiu, batendo a porta atrás de si.
Antes de entrar no elevador, começou a chorar, depois a rir, depois ficou sério.
Anitta chorou compulsivamente no banheiro e ficou lá, sentada no chão, a manhã toda.
Teve rompantes de arrependimento, mas sabia que se continuasse com Arnaldo, tudo voltaria a ser como antes. Não reconheceu que também falhou ao não se abrir com ele sobre a sobrecarga doméstica que sentia todos os dias. Para ela, era obrigação dele saber o que fazer.
Ela era mais independente que ele, se virava sozinha há anos. Arnaldo não, sempre foi orientado a fazer isso ou aquilo.
Anitta esperava uma atitude digna dele, pelo menos em insistir em continuar o casamento e teve a decepção quando ele concordou, sem discutir, em sair de casa. Para ela ele já esperava e até queria se separar, pela frieza com que ultimamente a tratava. E ele, sem entender nada, preferiu não piorar a situação e seguir seu rumo.
Coisas de casal.
Clara Lúcia
Triste quando apesar do amor existente o casal não consegue viver bem.Belo conto! Bjs chica
ResponderExcluirTanto desencontro deixou-me de coração apertado.
ResponderExcluirPassei para agradecer a sua amável "companhia" ao longo do ano e desejar um Feliz Natal.
Ruthia d'O Berço do Mundo
Santa falta de diálogo entre os casais! Isso é mais comum do que se pensa. Uma pena pois somente sexo não segura relação alguma. Já o diálogo e a compreensão, são fundamentais em qualquer relação. Belo texto Clara! Estava com saudades de seu espaço e textos. Acredita que não consigo acessar seu blog do meu trabalho? Por isso andei sumida. Amiga, um excelente e abençoado Natal para você e sua família. Um 2018 com muita paz e conquistas. Beijão
ResponderExcluirClara, seus contos sempre trazem perspectivas do cotidiano e gosto disso.
ResponderExcluirPassei para desejar boas festas, que muitas bênçãos e alegrias invadam seu novo ano! Grande abraço, tudo de bom!
Oi Clara, que lindo e bem enredado conto, que você partilha. Aliás você sempre criou belos contos nestes longos anos que lhe tenho no circulo de leituras e amigos. A relação aqui criada e inspirada é comum e tem feito muitas separações, a falta de diálogo.
ResponderExcluirGostei Clara. Estou muito afastado daqui desta página, prometo ficar mais atento ás atualizações, que recebo via email. Que Natal tenha sido bom para vocês e seus filhos e que assim possam esperar uma bela passagem de ano.
Obrigado pela companhia nestas viagens que já fazemos a tempo e renovo minha alegria em continuar com você na nova viagem.
Beijo amiga.
Saudações Clara, ando distante da blogsfera, raramente atualizo meu blog... hoje decidi revisitar os blogs que aprecio. Fico impressionando com seu talento para escrever, seus textos nos prendem. Parabéns pelo belo dom.
ResponderExcluirO conto acima é tão real, e serve de alerta para os casais estarem mais abertos ao diálogo.
Gratidão.
Um excelente, produtivo e abençoado 2018.