sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Quantas Vezes For

E o menino, ansioso por ter tantos sonhos, um dia acordou. 

Pegou sua mochila e foi onde deveria ir.

Aprendeu, ganhou, perdeu, sofreu, sorriu e ouviu.

"Sonhos não existem! Desista!"

E vendo que todos os outros meninos apenas aprendiam dobrou seu sonho e colocou dentro do bolso do paletó. Aquele paletó que nem lhe servia mais, embolorado e fedido, que ficava num canto do armário esperando caber em outro menino. 

Foi ser um robô da sociedade, exatamente como todos eram. Apenas aprendiam e cresciam, todos iguais.

Talvez não entendam esse meu texto e nem precisam entender... Nem eu entendo, mas é assim que está acontecendo.

Um ótimo fim de semana pra todos, bom carnaval pra quem gosta e bom descanso pra quem não gosta de carnaval. Como diz um amigo querido: SAM PRAN FRANT!

Uma música linda que é mais que um hino pra mim. Músicas têm essa magia de nos fazer viajar, pensar, recordar, chorar, sentir saudades, enfim, poemas que tocam nosso coração.


quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

VenceDora


      Dona Beatriz, que Deus a tenha, acertou em cheio na escolha do nome da filha. Dora, de venceDora. É a palavra ideal para definir essa mulher nos seus últimos tempos.

      O tempo passa e a hora de partir vai ficando mais próxima... Um dia a menos de vida, uma lágrima que nem escorre mais, uma dor num lugar que nem se imaginava existir... Mas a dor maior é a da solidão do fim dos tempos. Dói... Como um canivete cego que tenta cortar uma carne mole e não consegue... Para lá e para cá, forçando e apertando até abrir uma fissura que não sangra e que linha e agulha não costuram. Fica exposta, ao tempo, até definhar de vez.

      Ainda tem boa saúde, sua visão é de uma jovem e só usa óculos para ler as letras miúdas. Sua mente guarda coisas que nem o mais potente computador se lembraria, e é lucida. Que orgulho que Dora tinha de sua lucidez!

      Aos poucos e em doses homeopáticas presenciou a partida de gente querida... Primeiro seu pai, depois sua mãe, que teve todo o carinho de Dora até os últimos momentos. Solteirona assumida, mas não por vontade própria. Apenas ficou esperando um homem especial que se esqueceu de aparecer na sua vida. Ainda hoje quando sai por aí e se encontra com algum amigo dos bons tempos fica imaginando se não seria ele sua alma gêmea. Combinavam tanto... E não passou de uns olhares mais penetrantes. Logo se casou com outra e hoje tem uma penca de netos.

      Dora continuou cuidando, amparando, curando, ouvindo... E o tempo passou. Sem filhos, com sobrinhos todos encaminhados por aí e sobrinhos-netos sem paciência para responder as perguntas da tia solteirona que fica apertando suas bochechas. Uma linda idosa que não tem para quem contar as várias histórias de sabedoria que todos idosos têm. Quem sabe ainda dê tempo para escrever num caderno tudo o que achar importante, e num dia qualquer, depois de sua morte, algum curioso antes de doar seus pertences abra o caderno e se encante, pelo menos com a caligrafia desenhada. Seria demais imaginar um livro sobre sua vida. Todos têm um livro embutido chamado vida. O de Dora é mais um que logo ficaria eternizado numa estante, perdido em alguma casa de algum parente.

      Seus olhos azuis eram expressivos, penetrantes, instigantes. Contam as más línguas que Dora tinha o dom de ler os pensamentos. Bastava olhar fundo e ela descobria algum segredo que ninguém imaginava. Às vezes descobria até o que estava para acontecer. Os longos cílios deitavam em suas bochechas quando fechava os olhos. Os cabelos grisalhos se encaixavam harmoniosamente em cachos minúsculos, como se fossem moldados todas as manhãs. As rugas de expressão denunciavam dia após dia que a contagem regressiva caminhava a passos ligeiros. Até hoje perguntavam porque não casara. Porque não, respondia. Já se achava no direito de não dar explicações de nada sobre sua vida. Já estava no fim e quem quisesse saber que perguntasse para os mais velhos.

      Num sábado nublado, Dora acordou e não quis se levantar. A cama quente e a luz fraca do abajur eram seu aconchego. A cortina florida balançava suavemente com a brisa que entrava pelas frestas da janela. Nem quis saber que horas eram, queria ficar quietinha e conversar com Deus. Um monólogo torturante de quem não suportava mais ouvir a própria voz e nem ver a própria imagem no espelho. Esperar mais o quê, meu Deus do céu? Já cumpri minhas obrigações por aqui cuidando de irmão mais novo, de pai e de mãe, então que me leve logo para um outro lugar, onde não sinta tanta dor na alma como sinto neste quarto, nesta casa... Indagava a Deus e nem uma lágrima se atrevia a escorregar pelo rosto.

      Ficava imaginando fechar os olhos, dar um último suspiro e aos poucos o corpo ir padecendo, órgão por órgão, até o último cessar. O coração. Este que já suportou tantas dores de desaforos, tanta discriminação por simplesmente não ter gerado vidas em seu ventre, tanto descaso por ser uma idosa... Outro dia ouviu sem querer de uma sobrinha adolescente que gente ruim também envelhece e que nem todos velhinhos são bonzinhos. Será que falava dela? Preferiu nem saber. Se afastou sem fazer barulho e foi se sentar no alpendre da velha casa de seus pais que agora era sua. Não por direito pois sabia que esperavam sua morte para fazerem a partilha. Olhava as samambaias, penduradas na parede, com as folhas que caiam como cascata até encostarem no chão, verdinhas, sem nenhuma folha seca que lhe tirasse o frescor. Quem aguaria suas plantas quando ela se fosse?

      Um estorvo. Não dependia de ninguém e exatamente por esse motivo não a enfiaram num asilo. Se morresse naquele minuto talvez, quando dessem por sua falta, já estaria em estado de putrefação. Quem sentiria sua falta?

      Ainda deitada ouviu o relógio da sala tocar dez badaladas. A campainha tocou e Dora ficou se perguntando quem seria naquela hora? Ninguém batia em sua porta. Pela curiosidade pediu licença a Deus, colocou um robe e foi ver quem era. Um vendedor de pamonha, quentinha e com queijo! Ah, mas que delícia comer pamonha e morrer! Chegaria satisfeita nos céus. Quantas vezes ralou os dedos junto com as espigas para fazer pamonhas, numa das muitas reuniões de família! Comprou quatro. Duas comeria agora e as outras duas à tarde. E se morresse depois de comer duas como havia programado? Bem, se chegassem a tempo poderiam comer as outras duas.

      No caminho da rua até a cozinha parou na sala e ligou a TV como sempre fazia pela manhã. Quando se deu conta estava sentada no sofá com o prato com as pamonhas, comendo tranquilamente e assistindo ao seu programa favorito. Riu e olhando para o teto conversou com Deus:

      - Mas o Senhor é porreta mesmo, heim, meu Pai? Eu queria morrer, lembra? E olha o que o senhor coloca na minha frente: pamonhas! Tá bom, depois conversamos sobre uma outra data para eu morrer.

      Fim.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Direitos Iguais


Pergunta: por que o homem "galinha" não tem tanta fama ruim quanto a mulher "galinha"?

Porque o homem tem seu critério de escolha. Muitos não estão preparados para serem seduzidos. Preferem eles tomar a iniciativa e com isso faz com que esse critério se volte para as mais recatadas. Isso não quer dizer nada porque o que realmente encanta o homem é a postura, a afinidade, a atitude e a atração física.

Porque a mulher aceita o homem mesmo sendo galinha e ainda pensa, sonha e acha que vai conseguir modificá-lo e que ele será só seu a partir de então.

A diferença é que a mulher confunde liberdade com falta de bom senso. Oras, a mulher pode e deve fazer o que tem vontade, mas não queira depois se fazer de vítima e achar o mundo machista. Isso vale pro homem também, claro.

A mulher se envolve mais facilmente, se entrega, quer romance, cuidados, pra sempre, enquanto o homem, desde sempre, foi educado a ter sexo por necessidade. O homem é visão, é momento, é explosão. Está sempre pronto. E o mais importante: o homem é fiel ao homem. Defendem um ao outro sem ao menos saber da história. São fofoqueiros, porém não falam de suas mulheres. Falam das outras, das tais moças pra sair, pra transar. E, creio eu, que avisam quando uma mulher não é confiável. E antes de se encantarem, fazem a fila andar.

Agora, quando uma mulher tem essa mesma atitude de abrir os olhos e de avisar pode parecer que é inveja, que é recalque e que tá querendo seu bofe, tentando fazer intriga em seu relacionamento. E continua enxergando o que quer enxergar. Muitas vezes é inveja e recalque sim. Muitas não conseguem entender o que um homem vê numa certa mulher. E espalham aos quatros cantos tentando difamar a moça que talvez nem conheça. Prejudicam uma a outra sem a menor dificuldade. Se julgam tão superiores e tão maravilhosas que nem percebem que essa arrogância não lhes serve pra nada a não ser afastar os homens.

O famoso ditado "em relação de marido e mulher não se mete a colher", é muito válido. Ainda mais se for uma amiga a avisar da provável galinhagem do marido. A corda sempre vai estourar para o lado de quem meteu a colher.

Mulheres que abominam homem canalha também prestam atenção nos mexericos das amigas. Se perceber que a fama do moço não é tão boa, nem começam a se envolver. Acusam sem ao menos conhecê-lo. A ideia de serem traídas em algum momento faz com que desistam antes mesmo de viverem um romance. Fez a fama, deita na cama.

Ainda está longe desses diretos iguais serem realmente iguais. Homem é diferente de mulher. Cada um tem seu encanto, sua forma de ser, suas características, seu modo de pensar e agir. Não vejo graça em uma mulher querer ser pegadora descarada como alguns homens são. Também não vejo sentido o homem sair pegando toda mulher que apareça na sua frente. Cada ação tem uma reação. Muitas damas que estão acima de qualquer suspeita têm suas vidas agitadas por aí. Assim como alguns homens aprontam e ninguém acreditaria se ficasse sabendo.

A qualidade está acima da quantidade. Quem quer respeito que se dê o respeito.

Nessa luta pelos direitos iguais perdeu-se o encanto da conquista, do romantismo, da gentileza, do cavalheirismo... Perdeu-se o encanto de mandar flores, abrir a porta do carro, beijar a mão, carregar as sacolas, levar a moça em casa, enfim, tempos modernos.

Cada um tem a liberdade de fazer o que bem entender e com quem achar melhor. E quem tem um caráter mais aguçado não vai se importar com comentário nenhum. Afinal todos falam, alguns julgam, condenam e quem se sente "culpado" acaba concordando, mesmo que indiretamente.

Ou escolhem ou são escolhidos. Ou aceitam ou não. Ou permitem ou não. As pessoas nos tratam como nós permitimos ser tratados.

Uns vivem sem alarde e outros fazem questão de fazer propaganda. Essa é a diferença.

Apenas um post. Concordem ou discordem, claro!


sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Pequeno Peixe


Era uma vez um lindo aquário, enorme, onde havia muitos peixes de vários tipos e tamanhos.
Na parte de cima do aquário estavam os peixes maiores, pois quando a comida caía na água eram os primeiros a comer. Então os peixes de cima estavam sempre satisfeitos, nunca lhes faltava comida.
Na parte intermediária estavam os peixes de porte médio, havia para eles muita comida ainda, que os grandes peixes da parte de cima não comiam, mas não tinha tanta comida assim para que pudessem ficar grandes.
Na parte de baixo estavam os pequenos peixes. A comida que eles tinham para comer mal dava para deixá-los vivos, pois era a sobra dos peixes de cima.

No meio desse ambiente nasceu um pequeno peixe. Ele não se conformava com aquela situação, e começou a nadar pelo aquário, foi quando encontrou um pequeno buraco e ficou pensando onde aquele buraco iria levá-lo. Tinha uma grande esperança de mudar aquele quadro onde nasceu. O pequeno peixe então resolveu passar pelo buraco e ver onde ia parar.

Encontrou um fio de água que o levou para um ralo, do ralo caiu em um encanamento, e foi parar em um rio. Observou aquele lugar e viu que era maravilhoso, não faltava comida, tinha espaço suficiente para nadar e ir onde quisesse. Mas o pequeno peixe pensou em seus amigos do aquário e resolveu voltar para falar a respeito do lugar maravilhoso que encontrou.

Voltou ao aquário e começou a falar com todos sobre o lugar maravilhoso que havia encontrado. Todos os peixes ficaram curiosos e questionaram o que deveriam fazer para chegar a esse local. Foi quando o peixinho falou:
Os peixes grandes da parte de cima, deverão mudar de lugar, terão que vir para a parte de baixo, para perder peso e assim poder passar pelo pequeno buraco. Os peixes da região intermediária, deverão se alimentar menos, para perder um pouco de peso também. E os peixes de baixo, deverão se alimentar um pouco mais para obter forças para seguir viagem.

A confusão dentro do aquário começou, muita discussão, muita discórdia, e começaram a se revoltar contra o pequeno peixe. Depois de muita briga os peixes tomaram uma decisão, resolveram matar o peixinho que havia causado tanto transtorno àquele lugar.

Conclusão: Quantos de nós não" matamos" todos os dias as ideias, os conselhos, as opiniões, apenas porque não queremos mudar a forma com que estamos acostumados a viver e a agir? Até quando nossas resistências irão nos impedir de conhecer as coisas maravilhosas que estão apenas à espera de um pouco de humildade? Pense no quanto você tem sido resistente com a sua vida...

Se alguém conhecer a autoria, por gentileza me informe para colocar os créditos.



quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Chão de Pedras



      O dia estava quente e Susi caminhava rápido tentando se equilibrar em seu salto agulha olhando para o chão. Uma calçada esburacada fez com que atolasse o salto e o sapato ficasse para trás. Praguejou umas palavras e voltou para pegar o sapato e calçá-lo. Fechou os olhos e desejou voar para bem longe daquela cidade, daquela situação constrangedora onde todos a olhavam e comentavam uns com os outros. "Devem estar rindo de mim!", pensava. Caminhou mais rápido e com a cabeça mais baixa.

      Foi um dia difícil, com pessoas lhe tirando a paciência, aliás tinha pouca paciência no trabalho. Era atendente numa Repartição Pública. Odiava, mas como o salário era bom e o emprego garantido, suportava tudo e todos.

      Chegou cansada em casa e se jogou no sofá. Ligou a TV e cochilou... Dormiu até amanhecer, desleixada, com a mesma roupa que estava.

      Se levantou, atrasada como sempre e com dores pelo corpo. Tomou um banho rápido, se ajeitou sem se olhar no espelho e engoliu um café preto. Mais um dia chato pela frente, pensava.

      Andava olhando para baixo só para não ter que cumprimentar quem passava por ela. Uma eterna TPM, como diziam seus amigos. Mesmo assim ainda conservava uns bons amigos que a aturavam e a arrastavam para alguma diversão. E só ouviam reclamação e mais reclamação de Susi. Tudo era ruim, chato, sem graça e feio. Tudo tinha defeitos. Não se relacionava com ninguém porque achava os homens todos iguais. Nenhum prestava!

      No caminho até o trabalho passava em frente à uma floricultura. Era inevitável não virar o rosto e encher os pulmões com o perfume das flores. Tão lindas! Tão coloridas! Depois abaixava a cabeça e continuava seu trajeto.

    Como de costume entrou num café e comprou um pão de batatas que comeria pelo caminho. Era seu complemento do café da manhã. Nem percebeu que o rapaz do caixa não lhe cobrara nada. O dinheiro que pagou voltou, intacto. Susi simplesmente pegou a nota e guardou-a no bolso da calça. Um "obrigada" seco e sem ao menos olhar no rosto do jovem que há dias observava-a.

      Saiu, de cabeça baixa, andando tão rápido que esbarrava em todos que estavam à sua frente. Só parou quando uma mão tocou seu ombro, fazendo-a virar assustada.

      - Ei, o que foi? - perguntou indignada.

      Era o rapaz da padaria, que gentilmente correu para lhe devolver a carteira esquecida em cima do balcão.

      - Acho que é sua, não é? - gentilmente e com um sorriso largo perguntou para Susi.

      - Sim, obrigada!

      Renato estendeu a mão para se apresentar. Ela, num impulso retribuiu apertando-lhe a mão, receosa, mas foi tempo suficiente para sentir o olhar penetrante do rapaz. A boca ficou entreaberta, como se esperasse um beijo roubado, uma pegada na nuca e um entrelaçar em sua cintura. Ele falava e ela continuava hipnotizada, de boca aberta, alternando o olhar para os olhos e para a boca... E de vez em quando para o corpo do rapaz.

      Sem prestar atenção no que ele falava, Susi agradeceu mais uma vez, sorriu e se foi. Só depois que percebeu que ele havia feito uma pergunta. Olhou para trás e viu-o caminhando rápido, de volta para o café. Parou e deu um passo, mas achou melhor não. Tinha um longo dia pela frente e amanhã teria a oportunidade de se desculpar por não respondê-lo.

      Continuou caminhando e olhando para baixo. Começou a prestar atenção por onde andava, na péssima situação das calçadas de sua cidade, nos buracos perigosos e engolidores de salto agulha e algumas árvores mal cuiadas que se revesavam com as lixeiras fedorentas. Algumas pessoas passeavam com seus cachorros e outras mexiam no celular o tempo todo. Outras com fones no ouvido. Cada um seguindo seu caminho, andando, tropeçando, caindo, chorando, cantando, cegos e surdos, até que algo interessante lhe roubasse o sossego ou lhe devolvesse o sorriso. Ou quem sabe alguém que lhe despertasse a vontade de começar tudo de novo... E de novo e de novo...

      Mais um juramento que estava próximo de ser quebrado. O nunca mais se tornara uma frase corriqueira, com muita força quando dita no primeiro instante mas sem sentido nenhum quando se depara com um par de olhos penetrantes e uma boca carnuda.

      O dia foi difícil, como todos os outros, mas Susi não ficou tão nervosa como de costume. Estava ansiosa para chegar em casa, se deitar e dormir, para acordar e ir ao café, como sempre fez, mas com um motivo todo especial a partir de agora. Renato.

      E assim aconteceu. Ele no caixa, ela com seu pão de batatas, com um largo sorriso e um papo rápido. O suficiente para trocarem telefones e quem sabe marcarem um encontro.

      Fim.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Sorria, Alguém te Observa - Conto Sensual


      Cristina chegou em seu apartamento, tirou os sapatos na sala e caminhou até a enorme janela de vidro que pegava toda a parede. Abriu as cortinas, destravou o fecho, deslizou e deixou que a brisa invadisse toda a sala. Debruçou no parapeito e ficou admirando o por do sol ao longe, na grande metrópole que já brilhava com os faróis dos carros e com as luzes das ruas ainda tímidas, que lutavam para iluminar ainda com o sol.

      O calor sufocante fez com que Cristina permanecesse com o rosto virado para o horizonte, mas de olhos fechados, apenas sentindo a brisa do entardecer. Não se refrescou no dia quente que marcou 37º.

      Puxou uma poltrona azul que ficava perto da janela de forma que quando se sentasse nela poderia ver o céu mudando o tom de azul e, enfim, as estrelas mostrassem sua beleza. Mas o calor era sufocante, apesar da brisa que entrava no décimo segundo andar daquele edifício antigo e luxuoso.

      Tirou a blusa que colava ao seu corpo devido ao suor e jogou-a ao chão. Abriu o botão da calça jeans e se sentou relaxada na poltrona... Apesar de estar um pouco acima do peso e de não se considerar uma mulher bonita e nem sexy, gostava de seu corpo como era: tipo comum que não chamava a atenção dos homens quando andava pelas ruas, mas quem a conhecia intimamente, se apaixonava com facilidade. "Pelo conjunto da obra", dizia, para explicar o interesse que alguns homens tinham por ela e não por tantas outras mulheres lindas e de corpos perfeitos que circulavam em todos os lugares.

      Foi até à cozinha e voltou com um copo de água gelada com alguns cubos de gelo. Bebeu um gole. Outro gole... Pegou uma pedra e começou a passar em seu rosto... Com o calor do corpo as gotinhas escorriam pelo seu colo, molhando o sutiã e algumas escorregavam para o lado, pingando na poltrona. Lentamente foi descendo com a pedra pelo pescoço, pelo colo, e com a outra mão desabotoou o sutiã que tinha o fecho frontal. Não o tirou do corpo; apenas deixou que ficasse do lado dos seios... Passou o gelo em volta de cada um, sentindo o arrepio... Gemia baixinho... Gostava da sensação do gelo derretendo em seu corpo quente, emoldurando os seios... Desceu pela barriga e uma poça se formou em seu umbigo....

      Cristina olhou pela janela e viu que alguém do apartamento de frente a observava. Ficou uns instantes olhando para ver se o indivíduo desconfiasse e disfarçasse, saindo da janela. Mas não! Ele continuou olhando e debruçou no parapeito como se quisesse se aproximar mais daquela visão. Cristina ficou incomodada com a atitude do homem, mas não se deu conta de que estava com os seios à mostra. Quando percebeu cobriu-os com o braço, se levantou e fechou as cortinas. Se sentou de novo e ficou com raiva daquele homem abusado, indignada pela falta de respeito com ela, que estava dentro de seu apartamento tendo a liberdade para fazer o que quisesse.

      Deu um sorriso fazendo um gesto de não com a cabeça e começou a falar sozinha:

      - Mas como eu vou exigir respeito de um senhor que não conheço, estando semi nua? Mas que sem noção que sou!

      Voltou para a janela, já com o sutiã abotoado e agora também com a blusa, abriu as cortinas e olhou para aquele homem, prestando atenção em sua aparência. Ele, de sua janela, acenou para Cristina. Ela, sem jeito, retribuiu o aceno, mas fechou novamente as cortinas e foi tomar seu banho. Mas o homem não saía de sua cabeça. Era simpático, calvo, parecia ter estatura alta. Sim, simpático!

      A noite tomou conta da cidade e Cristina não parava de pensar naquela situação em que viveu. Quem sabe um dia conheceria aquele homem ousado, que a admirava enquanto se refrescava com o gelo, distraidamente com os seios à mostra, que se deu o direito de ter liberdade em sua casa mesmo correndo o risco de ser observada por ele e por tantos outros que também poderiam estar olhando.

      Bem, amanhã é outro dia.

      Fim.

      Texto publicado em 31 de outubro de 2012.


sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Ah, o Amor...

O amor é um sentimento tão profundo que nos deixa cegos para tudo mais. É uma verdade absoluta: se a paixão é capaz de transformar o mais hábil dos homens em um louco, o amor é capaz de transformar a mais louca das criaturas em uma pessoa muito hábil.

Miguel Falabella

Um ótimo fim de semana pra todos!


quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Matilde


      Quando o sol invadiu as frestas da janela do quarto de Matilde, José Bernardo já estava a dar-lhe um beijo na testa, pronto para sair para o trabalho. Ela abriu apenas um olho, balbuciou um bom dia e virou-se para o outro lado. Ainda tinha um bom tempo de sono, como era de costume. Era o sono da beleza, como dizia para as amigas. Queria dormir mais um pouco para estar bem disposta ao anoitecer.

      Sábado, dia de fazer faxina e de levar as crianças para a casa da avó. José Bernardo, como proprietário de um supermercado, trabalhava até tarde, mas quando chegava em casa a festinha particular era a garantia de uma ótima noite.

      Quando se conheceram foi amor à primeira vista. Ela, muito linda e com uma cinturinha de pilão de fazer inveja, conquistou de vez aquele rapaz empreendedor que desde novo já comandava um pequeno mercado. Hoje transformou o pequeno mercado num supermercado, grande o suficiente para dar uma vida confortável à família.

      As filhas estudavam em colégio particular, o melhor da cidade, e também faziam inglês, balé e natação. Matilde ficava por conta da casa. Gostava desse ofício e tinha orgulho de dizer que sua profissão era "do lar". Gostava de arrumar, lavar, passar, cozinhar, cuidar... Tinha prazer quando chegava alguma visita e elogiava o capricho e o perfume que sempre deixava a casa. Apesar de ser formada em Serviço Social optou por não seguir carreira. Tinha marido e era feliz. Isso lhe bastava.

      Especialmente no sábado ela caprichava um pouco mais. Margaridas naturais na mesa da sala e rosas vermelhas no quarto para perfumar a noite.

      Ah, as noites de sábado... Tão esperadas e tão especiais, desde que se casaram.

      José Bernardo era sisudo, ranzinza e mal humorado. Mas no sábado se transformava num "sex machine". Esse detalhe ela não contava para ninguém! Contar sobre sua vida íntima para as amigas só provocaria a curiosidade e não queria correr o risco de alguma mais afoita querer saber e provar se era mesmo verdade o que ela dizia. Só ouvia o que as amigas contavam dos maridos, ficava horrorizada e se calava quando chegava sua vez de entregar o ouro. Às vezes contava que sempre era a mesma coisa, o básico do básico, papai-e-mamãe e depois o marido virava para o lado e já roncava num sono profundo. É claro que elas ficavam inconformadas, mas Matilde dizia que estava bem assim, pois não gostava muito de sexo.

      No começo da noite as filhas já estavam prontas com suas mochilas e felizes por irem passar um dia na casa da vovó. Matilde, ansiosa, esperava a noite de sábado. Ah, o sábado!

      De volta, Matilde se enfiou debaixo da ducha e ficou por horas se preparando. Serviço completo com esfoliação, depilação e por fim um óleo bifásico espalhado pelo corpo. Pele macia, cheirosa, era o que o amor adorava. Depois colocou uma lingerie preta, com sutiã estruturado, todo rendando, fazendo conjunto com uma calcinha minúscula fio dental e por cima um robe preto transparente, de tecido fino e delicado. Os cabelos, apesar de curtos, eram ajeitados com um mousse e na nuca, nos punhos e atrás dos joelhos apenas umas gotinhas de um perfume francês que ganhara de presente de aniversário. Suave, discreto, mas que fazia presença quando José Bernardo encostava o nariz tentando tirar todo o cheiro do corpo da mulher amada.

      A cama tinha todo o capricho com um lençol branco de cetim, muitos travesseiros, todos com fronhas brancas bordadas delicadamente de vermelho. Tudo para combinar com as rosas vermelhas que já perfumavam o ambiente.

      Matilde ouve tocar a campainha. Mas quem seria? Será que o marido esqueceu as chaves? Correu para o interfone e perguntou quem era. Só faltava ser visita em pleno sábado. No sábado não! O sábado era só dela e do marido! A desculpa que sempre dava era que José chegava muito cansado e só queria cama. Por sorte era apenas um entregador com uma encomenda do marido. Voltou e colocou um vestido por cima de sua produção sensual para atender a porta. Um sorriso safado lhe estampou o rosto quando viu que era uma cesta de vinhos e queijos com duas taças de cristal, uma tábua com vários tipos de queijos, todos cortados como se fossem biscoitinhos e um vinho tinto, português, que ela adorava!

      Olhou no relógio e viu que o marido já estava quase chegando. Se sentou na cama e começou a ler um livro. Adormeceu. Acordou assustada com o barulho do carro entrando na garagem. Finalmente José Bernardo já estaria em seus braços levando-a ao delírio secreto.

      Ele entrou, colocou o casaco e a pasta em cima do sofá e foi direto para o quarto. Matilde estava ansiosa pois a primeira olhava que ele lhe dava dizia tudo! Era excitante ver seu homem sentir desejo por aquele corpo não tão jovem. E foi o que fez. Ele entrou, olhou para a mulher, mordeu o lábio inferior e começou a tirar a roupa. Depois se jogou em cima dela e começou a devorá-la num sexo suave seguido de um selvagem. Sem preliminares naquele dia.

      Mais uma vez ela sentiu seu perfume e percebeu que ele já havia tomado banho. O cheiro do sabonete barato não encobria o hálito azedo de bebida que exalava de sua boca fazendo com que ela virasse o rosto para o lado disfarçando sua ânsia de ter que tolerar um provável beijo nojento. Enquanto ele se fartava, Matilde discretamente percebeu um chupão em seu pescoço. E mais abaixo, na costas, um arranhado discreto. Continuou o sexo, sem sentir prazer. Era a hora de fingir que o sábado era realmente especial para ela. Ele, por sua vez, caprichava como podia, pensando que era o homem da vida de Matilde. E ela, fingia, sem sentir orgasmo, pensando que era apenas uma dona de casa na vida de José Bernardo.

      Depois de alguns minutos ele sai de cima da mulher, vira para o lado e já está praticamente dormindo, roncando, como um porco gordo e nojento. Matilde fica olhando para o marido sem entender porque ele fazia isso com ela. Era boa esposa, carinhosa, educada, prendada, ótima mãe e fazia todos os gostos dele. Não brigava, não discutia e sempre obedecia. O que mais um homem poderia querer de uma mulher?

      Bem, pelo menos ela tinha casa, família, filhas lindas, marido que a sustentava e sexo no sábado. O que mais ela poderia querer de um homem?

      Matilde, conformada com a vida, abriu o vinho, brindou com a outra taça vazia e se deliciou com os queijos. Qual seria a surpresa que ele lhe faria no próximo sábado? Deitou, zonza, depois de beber toda a garrafa e adormeceu.

      Fim.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Um Vício Bom


Um clic e o mundo está bem na nossa frente.

Outro clic e todos nossos amigos aparecem.

Mais um clic e escrevemos um livro virtual onde em questão de segundos o mundo todo tem acesso.

Internet, um vício bom!

Semana passada fiquei sem acesso à grande rede de computadores e confesso que quase tive uma síncope. Que poder é esse que a internet tem de nos prender por minutos, horas, dias, semanas, pra sempre?

Que necessidade é essa de estarmos conectados com tudo o tempo todo? Que necessidade é essa de não perder nenhuma notícia, nenhum comentário, nenhum texto, nada de nada?

Antes a TV era a grande vilã dos defensores da vida real sem influência de nenhuma tecnologia. Ainda é. Mas a internet tem esse poder de nos levar a lugares onde jamais iríamos e conviver com pessoas que jamais pensaríamos que um dia pudéssemos ter contato. Amizade virtual, amor virtual... Real!

Na vida palpável muitas vezes aguentamos pessoas ou situações que nos desagradam, mas no virtual basta um clic e tudo muda. Simplesmente aceitamos ou não.

Que maravilha se pudéssemos escolher lugares, trabalhos, pessoas, famílias e tudo o que imaginarmos pela internet. Basta um clic!

Foi péssimo mas ao mesmo tempo foi ótimo ficar desconectado por uma semana. Não por achar que esse vício tira meu tempo, mas por prestar atenção em outras coisas também, onde meus olhos alcançam, onde meus ouvidos ouçam e onde meu faro sente o perfume.

Antes de tudo isso existia vida sim e não era ruim! Não sou obcecada por tecnologia. Me considero jurássica com tudo isso, ainda. A internet me basta por enquanto e mesmo assim ainda me perco em coisas simples de serem executadas. Aí basta uma chamadinha e lá vem minha linda filha loira me acudir! Ou meu lindo filho também loiro me socorrer! Me explicam, me ensinam, mas sei que daqui a pouco já me esqueci de tudo e eles voltam de novo para me acudir. A vida real interagindo com a tecnologia.

Tudo isso sem falar nas pessoas maravilhosas, comuns e amigas que cultivamos no decorrer do acesso. Não é a internet que vicia, são as pessoas do outro lado da telinha que nos atraem, que nos puxam, que nos agregam aos seus círculos de contatos e que nos fazem tão bem!

Então é isso. Estou de volta e morrendo de saudades de todo mundo!

Aos poucos colocarei as visitas em dia e os e-mails serão respondidos.

Tem uma pesquisa do lado direito. Respondam pra mim?

Uma ótima semana pra todos!