sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Essa Bete!


      No último feriado, Carla viajou até sua cidade natal para rever uns parentes que há anos não via. A cidadezinha era perto, mas mesmo assim, não gostava muito de ir lá; mas adorava o povo simples e super hospitaleiro. Chegou de manhã e iria embora no outro dia à tarde.

      Ficou hospedada na casa de uma tio muito querido, tio Quézim, que ficara viúvo há pouco tempo. Ainda tinha a responsabilidade de cuidar de duas filhas moças. Carla adorava a tia que falecera, e por isso fez questão de ficar lá com as primas Geovana e Geonalva.

      Carla foi recebida com uma mesa farta de café da manhã, com bolos, bolachinhas, biscoitos, café e leite fervido. Só de olhar, um desespero tomou conta sua cabeça magra; mas não resistiu e provou um pedaço de cada, ficando satisfeita.

      Todos sentados à mesa e a conversa se desenvolvia com um pouco de tristeza, mas com momentos de gargalhadas, pois tio Quézim era muito engraçado. Carla disfarçava para não rir o tempo todo daquele tio simples, que trabalhava na roça de um outro parente, e que tinha a vida tranquila e "farta" como ele mesmo dizia: "farta muita coisa aqui, fia!".

      Papo vai, papo vem e Carla quis saber um pouco mais da tia Rosinha, pois nunca teve notícias de que ela estava doente. Os olhos de tio Quézim se encheram de lágrimas, mas ele as engoliu e começou a falar:

      - Sabe, fia, ninguém sabia que a Rosinha tava doente não... uma muierona forte, robusta, trabaiadeira e boa... é, ela era a bondade em pessoa. Que Deus a tenha! - e fez o sinal da cruz quando falou isto.

      Carla, que queria entender como isso aconteceu, perguntou se era problemas no coração, mas tio Quézim negou:

      - Não, fia, ela tava com o "diabo da Bete". - Pronto! O que seria isso que Carla não sabia? Mas ficou sem jeito de perguntar, pois o tio estava muito emocionado.

      As primas abaixaram a cabeça e ficaram quietinhas ouvindo o relato do pai. Mas Carla ficou especulando para ver se conseguia mais dados para chegar a uma conclusão. Não conseguiu, pois o tio não parava de falar o quanto a mulher amada era boa pessoa, que não deveria ter morrido, que ele que deveria ter morrido no lugar dela, que ela vai fazer muita falta... e chorava e limpava as lágrimas na gola da camisa encardida de vermelho, devido a terra daquela cidade ser de cor avermelhada.

      Depois de um tempo, o tio precisou sair para voltar para a roça e deixou Carla com as primas para fazerem visitas aos outros parentes. Mas a curiosidade permanecia, porque não conseguiu descobrir o que seria esse "diabo da Bete".

      No outro dia, acordou tarde e as primas já estavam com o almoço adiantado; tomou só um café preto com um pedaço de bolo de fubá e foi arrumar sua mala para retornar para sua cidade logo mais às quinze horas. Depois ajudou as primas e lavou as louças depois do almoço. Pronto, hora de ir embora.

      Na despedida, tio Quézim abraçou forte a sobrinha e desejou lembranças para toda a família, dizendo o nome de quase todos; Carla abraçou as primas e se foi.

      No ônibus, se sentou com uma senhora muito simpática e começou um papo. Aí teve coragem de perguntar o que seria esse "diabo da Bete".

      - Uai, fia, é diabetes! Sabia não? - respondeu a senhora, estranhando a moça não saber uma coisa tão comum hoje em dia, como ela mesma definiu.

      Ah, tá! Carla não sabia se ria ou se ficava com vergonha de ter deixado para trás suas raízes, sua cidade  onde nasceu e cresceu, e aqueles parentes todos. A partir daí resolveu que não ficaria mais tanto tempo sem ter contato com todos eles. Durante a viagem, vez ou outra, dava uma gargalhada, tentando esconder, mas não conseguia... e o pessoal todo olhava para ela sem entender nada. Tudo bem, até uns minutos atrás quem não entendia nada era ela, uai!

Um ótimo fim de semana!


8 comentários:

  1. Oieeeeeeeeeeeeeeeee!!!

    Eu não conhecia esse diabo e nem quero conhecer!

    Beijuxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx...

    KK

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  2. Minha escritora querida! Você é de um talento que merece ter um lindo livro publicado, não vou desistir de fazer a sua cabeça, viu?! ;)
    Amada vc me emocionou muito com esse conto de hoje, mas hoje em dia já é uma emoção embalada por sorrisos e saudade nada de sofrimento... Vc me fez lembrar demais de meu vôzinho paterno que era exatamente igual ao tio Quézim, a simplicidade em pessoa. As diversas histórias dele lendo o seu conto me fez lembrar. Os nomes muito próprio que ele criava para as coisas, aliás ele e também minha avó, a esposa deles. Ambos de famílias muito humildes de Aracaju, ele mais que ela porque não teve a oportunidade de estudar, aliás falei dele no post do dia da alfabetização que falei em meu Cantinho... Meu avô era do tipo que dava boa noite ao Cid Moreira no final do JN, conversava com a secretária eletrônica e não tomava banho se assistia ao filme Tubarão, com mede que ele saísse pelo chuveiro... rsrs Essas pessoas existem de verdade e são puras que nem crianças, essas não viram adultos nunca. Amei! Parabéns pela delícia de conto, minha contista querida! Você é perfeita nisso!
    Beijo, beijoooooooo!
    She

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    1. Publiquei correndo sem reler e tem aí mil erros, amiga, desculpa! :(

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  3. rsssss...Muito boa!!! Adorei! Pior uma faxineira que me disse que ia se operar do penis...(apêndicite,srrs) beijos,chica

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  4. Oi flor!

    Muito legal a maneira leve como vc contou esse encontro com sua família em um momento delicado. Mas olha, nao deixa de ter razão o seu tio, né?

    Beijos
    Selma

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  5. Você escreve de uma forma leve...Gosto muito! Muito bem humorada esta sua história.
    Bom fim de semana.
    Beijos.

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  6. Hehehe, o pessoar da cidade se acha muito esperto!
    Muito bom, leve mas com uma mensagem para as famílias...
    Um doce domingo, querida
    Beijos
    Ruthia d'O Berço do Mundo

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  7. Belo desenrolar amiga,gostei do conto.
    Nosso interior é uma maravilha com toda linguagem.
    Parabens pela construção/inspiração.
    Meu abraço Clara.
    Boa semana a voce.
    Bjo.

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